Revista Montanhas Nº 2 Janeiro de 2014
REVISTA MONTANHAS | 29 A ilha é gerida pela Marinha do Brasil, que desde 1957 mantém lá o Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade (POIT), onde uma guarnição de cerca de 40 militares, metade trocada a cada dois meses, proporciona uma ocupação permanente que garante a soberania brasileira não apenas sobre a ilha em si, mas, principalmente, sobre o mar territorial de 200 milhas ao seu redor. Há, também, a Estação Científica da Ilha da Trindade (ECIT), uma confortável base de apoio às muitas pesquisas que são lá desenvolvidas a cada ano, além de uma presença permanente do Projeto Tamar, já que todas as suas poucas praias de areia são pontos regu- lares de desova de tartarugas marinhas, especialmente a tartaruga-verde (Chelonia mydas). Com área de apenas 9,28 km², a Ilha da Trindade apresenta um grande número de pon- tões rochosos escarpados, em geral de fonolito, rocha muito dura que sobreviveu ao des- gaste de outras rochas mais macias ao redor. Até recentemente, apenas os mais fáceis deles haviam sido escalados por escaladores militares, mas este ano eu e meus dois parceiros ha- bituais de andanças no interior do país, Miguel Freitas e Sandro de Souza, acompanhados por outro amigo, Ricardo Barsetti, na condição de equipe de apoio, conseguimos, após um longo processo, autorização para tentar as primeiras vias técnicas no local, com foco nas suas montanhas ainda inescaladas. Em pouco menos de três semanas, subimos três pontões virgens espetaculares e outras seis vias próximas ao POIT, num total de cerca de 600 m de escalada sem um grampo sequer, apenas com proteção móvel – nuts e, principalmente, friends, sempre muito sólidos. Foram estabelecidas, no entanto, algumas paradas duplas para rapel com grampos de titânio, para maior durabilidade. Omais interessante, neste caso, é que estes grampos foram em sua maior parte batidos, e não colados, com o batedor desenvolvido pelo Miguelzinho, que permite que se conquistem vias com eles, ou seja, que elas possam ser abertas de baixo para cima, guiando, no estilo tradicional brasileiro. As vias que abrimos foram todas relativamente fáceis, mas feitas em câmera lenta devido à incrível quantidade de pedras soltas que havia por toda parte, e que eram diligentemente jogadas para baixo por quem ia na frente, pois um acidente lá era algo fora de questão: na ilha há apenas um pequeno posto médico, cujo único profissional só dispõe de meios para o atendimento dos casos mais simples, e não existe possibilidade de salvamento de um ferido que não seja o autorresgate pelos membros da própria equipe. O termo de assunção de riscos que assinamos antes de embarcar pouco difere da última carta de um suicida! Caranguejo-amarelo (Gecarcinus lagostoma), onipresente na Ilha da Trindade - Foto: André Ilha Pico Preto - Foto: André Ilha O Túnel, famoso ponto da Ilha da Trindade Naufrágio de um cargueiro coreano, e ao fundo navio de patrulha oceânica da Marinha - Foto: André Ilha
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