Revista Montanhas Nº 2 Janeiro de 2014

Uma coisa que evoluiu muito nos últimos anos dentro da escalada foram as “Academias de Escalada”. Todos os meses pipocam em todos os cantos novas “sa- linhas”, novos murinhos e até mesmo academias de alto nível. Tá, o número não é tão grande assim no Brasil quanto poderia ser. Mas o fato é que nunca se teve tanto a oportunidade de se treinar, o que de um lado fez com que as pessoas que já escalam acabassem ficando mais fortes, e por outro lado, fez com que muita gente que nunca teve contato com o mundo da escalada pudesse aos poucos se deixar envolver por esta religião esporte filosofia de vida tão contagiante. Hoje em dia não é raro encontrar pessoas que escalam há menos de 1 ano já malhando sétimos e oitavos graus nas academias e fazendo “fingerboard” e “campusboard” com a disciplina de um Samurai. Mas de repente, quando chegamna rocha, alguns não conseguem traduzir seus treinamentos em cadenas “significativas” e acabam escalando tanto quanto outras pessoas que não treinam com tanto afinco e cur- tem a escalada de uma maneira muito mais relaxada. Por que isto acontece? Fazendo uma tradução literal do inglês, essas pessoas que, mesmo fortes não transparecem toda a força que têm ao escalar na rocha, e mesmo assim continuam treinando para ficarem mais fortes estão “latindo para a árvore errada”, ou seja, não estão fortalecendo o elo mais fraco da corrente. São basicamente dois motivos que contribuem para o fiasco dessas pessoas na hora de escalar na rocha. Um deles é a falta de uma base sólida em suas pirâmides de cadenas, ou seja, sem ter mandado uma quantidade suficiente de sextos graus, já partem para malhar sétimos gordos e oitavos graus. Isso acaba deixando seu repertório de movimentos bastante limitado o que acarreta num precário trabalho de pés ou criatividade na hora de resolver uma sequência à sua maneira. O outro motivo, talvez o mais relevante, é o medo de cair. Esse medo que nos bloqueia e nos faz desescalar um crux superdifícil inteiro em vez de buscar o próximo agarrão e costurar, é mais comum do que você pensa. E ele não é exclusividade desses iniciantes que vão commuita sede ao pote. Muitas meninas que começaram a escalar de TopRope e ficam fortes e técnicas, acabam tendo certa dificuldade na hora da transição para a escalada guiada justamente por causa deste medo. Elas acabam tendo força pra mandar nono grau por exem- plo, mas encadenam no máximo 8a/8b porque está bem abaixo de seus limites. O mesmo vale para aqueles ratos de academia acostumados com chapeletas a cada 90cm (como diria o Alê Silva, o chamado Auto-TopRope). E esse medo não é tão simples assim, porque ele se esconde em nosso subconsciente e fica lá, se esguei- rando e só se mostra quando a costura passa da linha da cintura. Aí ele cresce e vira um Dragão, toma conta da gente e ofusca nossa visão. Por isso justamente nessa hora não conseguimos perceber que tem um agarrão do lado do regletinho do qual estamos pagando um “Montê” enquanto tentamos clipar a próxima costura que, igual ao rabo da vaca que fica menor quando ela tenta abanar as moscas, fica mais longe quando tentamos passar a corda. Nossa! Só de imaginar a situação sua mão já não começa a suar? Agora você deve estar pensando que eu vou ensinar como mandar esse dra- gão embora. Sinto muito desapontar-lhe mas infelizmente não tem como fazer o dragão ir embora. Em vez disso vou tentar lhe ensinar a conviver com ele. Esse medo de cair é como aquelas pessoas inconvenientes, que quanto mais atenção você dá a elas na esperança de que elas irão embora, mais elas ficam para lhe es- torvar. Sendo assim, é preciso aprender a ignorar esse medo não tão irracional as- sim de cair. E é aí que está o pulo do gato. Através de sua mente racional, você deve aprender a “enganar-se a si mesmo” e a melhor forma de provar pra você mesmo que uma queda é normal, é caindo! Quanto mais você cai, mais você percebe que não tem nada de errado em cair. Obviamente que não estamos falando de você fazer uma via em móvel com proteções precárias numa rocha podre com blocos soltos e esticões cabulosos. Isso já seria o nível “Mestre Jedi” dentro do domínio do medo. Por enquanto vamos focar em como deixar de ser um mero “Padawan” e se tornar um “Cavaleiro Jedi” (e tirar o seu Brevê). Certifique-se de que está seguro de verdade. Para fazer isso, você deverá então combinar com seu(ua) parceiro(a) de escaladas e assegurador(a) fa- vorito e que você mais confia (doravante denominada “seu seg”) uma sessão exclusiva de quedas e vôos. Se for na rocha escolha uma via com costuras próximas e que você consiga subir até o final tranquilamente. Na rocha ou uma parede indoor, escolha uma via que seja levemente negativa. Faça o “Partner Check” (na verdade esse hábito você deve ter toda vez que for escalar, não só nos treinos de queda) e verifique: co- loque a mão mesmo, no mosquetão do seu seg para ver se está fechado e travado, em todas as fivelas da cadeirinha e teste se a corda bloqueia no freio de ver- dade (usar um daqueles com frenagem assistida tipo o grigri ou megajul ajuda a cabeça). Em seguida faça ele conferir seu nó, se está passado nos dois pontos, se suas fivelas estão fechadas e se está tudo certo. E Beto ejetando da agarra na Quebra da Barreira da Ilusão, no Cuscuzeiro Por Rodrigo “Genja” Chinaglia 20 | REVISTA MONTANHAS

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